quarta-feira, 12 de julho de 2017

Supernovas: a morte de estrelas

Por Rafael Hideki Ishida, aluno do Prof. Dr. Jorge Meléndez


Ponte entre o passado e o futuro do Universo

Nebulosa do Caranguejo. Remanescente da Supernova ocorrida no ano de 1054. (c) Hubble/NASA
Quando ouvimos pela primeira vez a palavra "supernova", podemos ter uma primeira impressão equivocada sobre esse grandioso e importantíssimo evento astronômico. Apesar do nome, as supernovas estão relacionadas com os estágios finais da vida das estrelas. Acontecem devido a explosões que ocorrem em estrelas com mais de 8 massas solares ou em sistemas binários com uma ou duas anãs brancas.

O primeiro passo para estudarmos as supernovas é analisarmos a evolução das estrelas de alta massa. Estas, apesar de possuírem muito hidrogênio, vivem muito menos do que estrelas de baixa massa como o Sol. A luminosidade (energia emitida por segundo) dessas estrelas é muito alta, devido a uma queima de hidrogênio muito mais intensa. Assim, a passagem dessas estrelas pela Sequência Principal é feita muito rapidamente (em comparação a estrelas de baixa massa). O hidrogênio vai sendo convertido em hélio na região central, mas quando o hidrogênio nessa região se esgota teremos um núcleo de apenas hélio e a estrela entra no chamado "Ramo das Gigantes Vermelhas". Em seguida, o hélio começa a ser queimado na região chamada de "Ramo Horizontal" e posteriormente a estrela parte para o "Ramo Assimptótico das Gigantes". Nesta fase, estrelas de baixa massa produzem um núcleo de carbono e oxigênio, dando fim à evolução química em seu interior. Porem, devido às elevadas temperaturas e densidades, estrelas de alta massa podem atingir condições necessárias para sucessivamente fusionar elementos mais pesados em seu núcleo, gerando camadas de carbono até silício em seu interior, tudo sobre um núcleo de ferro e níquel. Após a formação desse núcleo de Fe-Ni, a estrela se encaminha para o seu glorioso fim: a supernova.

Interior de uma estrela de alta massa próxima do seu fim. Fonte: Adaptado - FREBEL, Anna; Searching for the Oldest Stars, 2015, p. 70.


A queima do silício é a última fase de fusão nuclear da estrela. Neste momento, a temperatura é suficiente para que ocorra a fotodesintegração, que é um processo no qual núcleos de ferro são bombardeados por fótons, quebrando-os em prótons e nêutrons. A fotodesintegração consome energia da estrela, levando a uma perda de pressão e ao colapso do núcleo. Os recém produzidos prótons da fotodesintegração são capturados pelos elétrons degenerados do núcleo, formando um nêutron e um neutrino em um processo chamado decaimento beta inverso. Esta perda de elétrons (e pressão de suporte dos elétrons) intensifica ainda mais o colapso da estrela, que acontece a altíssima velocidade. A nível de comparação, se o mesmo colapso acontecesse com a Terra, esta seria transformada em um esfera de 50 km de raio em apenas um segundo.


Devido à altíssima velocidade dos acontecimentos, no início as camadas mais externas da estrela nem percebem os processos no núcleo. Este agora é formado dos nêutrons degenerados provenientes da fotodesintegração e decaimento beta inverso. Conforme o colapso avança, sua densidade se aproxima da densidade dos núcleos atômicos (cerca de 1017 g/cm³). Logo, o núcleo se torna uma estrela de nêutrons, um remanescente de estrelas com massa inicial entre 8 e 20 massas solares. Caso a massa inicial seja maior a 20 massas solares, o remanescente será um buraco negro. A alta densidade faz com que qualquer matéria que caia no núcleo seja refletido, formando uma onda de choque que percorre as camadas da estrela até a superfície. O calor trazido por essa onda é capaz de causar novas fotodesintegrações, produzindo mais nêutrons. Através da sua captura, esses nêutrons são responsáveis por gerar novos elementos mais pesados que o ferro.

A estrela agora está perto do seu fim. Os neutrinos acumulados do decaimento beta inverso reforçam a onda de choque, que ganhará velocidade e energia suficiente para a explosão e desintegração da estrela. As camadas mais externas com elementos químicos previamente criados, junto com elementos recém formados, são jogadas para o meio interestelar, deixando a estrela de nêutrons pra trás. Este tipo de explosão, devido ao colapso de estrelas de alta massa, é o que chamamos de Supernova do tipo II. As supernovas são os eventos mais energéticos do Universo. Durante a explosão, elas possuem uma luminosidade bilhões de vezes maior que a do Sol, podendo ser vistas de galáxias muito distantes. A análise da luminosidade da supernova pode nos dar informações sobre o seu tipo. Analisando o formato das curvas do gráfico abaixo, podemos diferenciar as supernovas tipo II e tipo Ia.


Curva de luminosidades de Supernovas tipo II e tipo Ia. Fonte: Adaptado - FREBEL, Anna; Searching for the Oldest Stars, 2015, p. 100.

As supernovas tipo Ia são aquelas originadas de sistemas binários envolvendo anãs brancas. Nesse contexto, ocorre a transferência de massa da estrela mais massiva para a anã branca. Caso esta chegue ao limite de Chandrasekhar (1,4 massas solares), a pressão gravitacional supera a pressão de degenerescência dos elétrons, levando-a a contrair-se. A anã branca então começa a queimar seu carbono, aquecendo-a. A partir desse ponto, o interior da estrela passa por processos semelhantes aos que vimos para estrelas de alta massa. Diversas cadeias de reações nucleares produzem novos elementos, sendo o ferro e o níquel os mais pesados. A rapidez com que esses processos ocorrem acabam por desintegrar a estrela, fazendo-a explodir. Estas são as supernovas tipo Ia. Um processo parecido ocorre com sistemas binários de duas anãs brancas.que colidem, se tornando um objeto único. Este objeto possui uma massa que ultrapassa o limite de Chandrasekhar e também acaba explodindo.

Processos de formação das Supernovas tipo II e tipo Ia. Fonte: Adaptado - FREBEL, Anna; Searching for the Oldest Stars, 2015, p. 96.


Outra diferença entre as supernovas tipo II e tipo Ia está no espectro delas. Observa-se que linhas de hidrogênio são presentes na primeira, mas não na segunda. O avanço na observação de supernovas e nos espectros nos permitiu especificar ainda mais a classificação de supernovas. Como a figura abaixo mostra, temos ainda os tipos de supernovas Ib e Ic, que são muito raras. 


Classificação das Supernovas segundo seus espectros. Fonte: Adaptado - FREBEL, Anna; Searching for the Oldest Stars, 2015, p. 102.

Analisando os acontecimentos que procedem esse grandioso evento astronômico, talvez relacionar juventude e supernovas não seja tão equivocado. As supernovas representam o fim das estrelas de alta massa, sendo responsáveis por enriquecer o meio interestelar com os elementos químicos formados durante a sua vida. Esses elementos estarão presentes nas futuras gerações de estrelas que, por ventura, venham a se formar em nuvens de hidrogênio enriquecidas com os metais ejetados por supernovas. Assim, estudar uma supernova é um dos pontos chave para entendermos a evolução química da Galáxia, uma vez que podemos ver como as estrelas mais recentes se enriqueceram com os elementos mais pesados formados ao longo dos anos. Dessa maneira, é interessante interpretarmos as supernovas como um evento que relaciona as gerações antigas de estrelas com as novas, como uma ponte que liga o passado e o futuro do Universo.

Um comentário:

  1. Incrível como em todos esses anos acompanhando Astronomia e Astrofisica eu nunca havia ouvido falar em decaimento beta inverso

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